Na Cracolândia, crianças ficam expostas a abusos
Negligência e exploração também foram abordados com 500 menores que vivem na capital paulista
Trabalho infantil, acesso fácil às drogas, atividades ilícitas, entre outras situações de risco não colaboram para uma infância digna de crianças e adolescentes. Essa é a realidade da população infantil que vive nas ruas do centro de São Paulo. Nesse sentido, a Visão Mundial - organização não governamental humanitária especializada na proteção à infância, em parceria com outras organizações, realizou uma pesquisa que destaca dados inéditos sobre os principais problemas das crianças e adolescentes na região da Cracolândia. O lançamento ocorreu ontem, na Missão Cena, em São Paulo.
Foto: Prefeitura de São Paulo
O diagnóstico "A Criança no centro: um retrato das infâncias na cidade de São Paulo" destaca a realidade de 586 crianças e adolescentes entre 03 a 17 anos que são atendidas pelas organizações IBTE, Novos Sonhos, Missão Cena e JEAME, e que foram ouvidas por meio de questionários. A pesquisa analisou, com faixas-etárias separadas de 02 a 06 anos, de 07 a 11 anos e 12 a 17 anos, questões do bem-estar e violação ao direito à alimentação, lugares em que as crianças e adolescentes gostam de estar, urgência de proteção infantil, violação à proteção: abusos, negligência e trabalho infantil e desrespeito explícito dos direitos como falta de cuidado, contato precoce com as drogas, atos infracionais, além da renda familiar e o desafio da empregabilidade no centro.
O objetivo da pesquisa é qualificar a intervenção das organizações envolvidas na assistência das crianças e adolescentes do centro de São Paulo por meio do entendimento das necessidades dos públicos variados e, com isso, ampliar a capacidade de atuação das organizações e da sociedade civil a fim de que se tenha um resultado melhor dos mais vulneráveis da região.
"Há mais de um ano observamos as crianças e adolescentes do centro que estão submetidas a uma sorte de violação dos direitos fundamentais previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente. Elas residem em locais insalubres, são filhos e filhas de famílias numerosas, sem local público para brincar e estão suscetíveis a fácil acesso às drogas, e vítimas generalizadas das diferentes violências", conta o gerente de projetos especiais da Visão Mundial, Raniere Pontes.
Mesmo com a situação alarmante, a Visão Mundial acredita que há uma possibilidade de transformação da realidade das crianças e adolescentes. "Mais de 70% da população infantil acredita que os projetos sociais ajudam em seu desenvolvimento. É preciso que todos nós, em parceria com iniciativa privada, organizações sociais e governo municipal nos juntemos para transformar positivamente a cruel realidade das crianças e adolescentes que compromete os seus futuros", afirma Raniere.
PRINCIPAIS RESULTADOS
Crianças de 02 a 06 anos
- Insegurança alimentar: no geral, 100% das crianças afirmaram que se alimentam em casa; destas, 88% também acessam comida no projeto, 22% também se alimentam na escola e 29% na rua.
- Rua e o lugar da criança: a maior parte das crianças (88%) gosta de ficar em casa, 12% preferiu não responder à questão ou disse não gostar das suas casas. A rua aparece como 51% de preferência, os projetos como 80% e a escola como 20%.
- Urgência da proteção infantil: dados apontam que 51% das crianças estão em situação de extrema violação dos direitos.
Crianças de 07 a 11 anos
- Educação na idade certa: todas as crianças declararam estar na escola, mas os dados apresentam distorção em relação à série e idade, pois 73% das crianças estão na idade certa, 12% em distorção e 15% de respostas foram inconsistentes.
- Bem-estar e violação ao direito à alimentação: quando 81% das crianças entrevistadas afirmaram que não dormem com fome, revela-se o dado de que 19% delas dormem com fome ou não souberam responder essa questão.
- Violação à proteção: abusos, negligência e trabalho infantil: pelo menos 37% dos participantes declararam sofrer alguma violência. Cerca de 70% são vítimas de violência doméstica.
- Trabalho infantil: 12% das crianças nessa faixa-etária responderam "sim" quando questionadas se trabalham. 78% não mencionam nenhuma atividade caracterizada como trabalho, 16% realizam atividades domésticas e 6% declararam atividades que se configuram como trabalho infantil.
- Projeto e apoio a vida: 93% das crianças respondeu que o projeto ajuda em casa, 90% afirmou que ajuda na escola, 91% que ajuda com os amigos e 93% afirmou que o projeto ajuda na alimentação.
Crianças e adolescentes de 12 a 17 anos
- Escola e distorção de idade: 6% indicou estar em séries antecipadas, acima do esperado para sua idade, 39% estão na idade certa, 49% das crianças estão em situação da distorção de idade e série, 4% está fora da escola e 3% não quis responder à pergunta.
- Insegurança alimentar e questão nutricional: 79% afirma que "não" foi dormir com fome, enquanto 14% não quis responder ou deixou a pergunta em branco, 8% afirmou que sim, elas ou alguém da família foi dormir com fome.
- Bem-estar e a escada da vida: foi realizado um exercício onde o adolescente imagina sua vida como uma escada de 8 degraus e correlaciona a pior vida com o degrau 1 e a melhor com o degrau 8, onde 34% dos adolescentes disseram que têm a melhor vida possível, 50% deles se posicionaram em níveis medianos e 16% se colocaram nos primeiros degraus da escada da vida (baixa perspectiva).
- Violações explícitas dos direitos:
a) Local de risco: foi perguntado aos adolescentes se eles poderiam identificar pelo menos dois riscos ligados à proteção; 22% disseram que saberiam identificar e 26% disseram que não conseguiriam identificar; outro grupo, de 52%, não quis responder ou deixou em branco.
No geral, 68% dos riscos referem-se a condições comunitárias e ações repressoras do Estado, 21% a fatores do ambiente familiar (moradia, maus tratos, relações interpessoais violentas) e 11% atribuíveis a fenômenos sociais.
b) Falta de cuidado: 34% responderam "já gritou comigo", 46% afirmaram "insultou-me, me xingou, falou mal de mim", 69% "bateu em mim, me deu um tapa, um murro com suas mãos, mas sem nenhum objeto, ou me chutou" e 78% responderam "me maltratou fisicamente de outra forma".
c) Contato precoce com as drogas: 3,8% declararam usar maconha algumas vezes e a mesma quantidade já fumou cigarro; já álcool 25% já teve contato algumas vezes e 1,3% usa com frequência.
d) Atos infracionais: 79% nunca tiveram contato com furto/roubo, outros 13% responderam que já estiveram envolvidos em algum momento com atos infracionais especialmente roubos/furtos, 8% preferiu não responder.
e) Exploração do trabalho: 76% não trabalha, 5% não respondeu e na soma, 19% dos adolescentes trabalha às vezes ou sempre (e não é em programas oficiais) de vendedores de milho, balas e chicletes a ajudantes em lojas e lanchonetes.
- Lugar do projeto na vida: foi perguntado onde eles estariam se não estivessem no projeto. 43% responderam que estariam em casa ou em família, 3% na escola, 5% na praça, 11% na rua, 18% não sabem onde estariam, 1% acompanharia a mãe no trabalho, 4% estaria em outros projetos e 15% deixaram a pergunta em branco.
- Projeto e ajuda na vida: 55% dos meninos e 31% das meninas afirmaram que o projeto contribui para seu futuro.
(Com AI da Visão Mundial)
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